O Contrato de Fiança e o Risco para o Fiador: Como Proteger Seu Patrimônio em Financiamentos e Aluguéis
🛡️ O Contrato de Fiança e o Risco para o Fiador: Como Proteger Seu Patrimônio em Financiamentos e Aluguéis
Assinar um Contrato de Fiança é, muitas vezes, visto como um simples ato de ajuda a um amigo ou familiar. No entanto, ser fiador — seja em um contrato de aluguel, seja em um financiamento de alto valor — é assumir uma responsabilidade civil e financeira de enorme peso. Juridicamente, o fiador coloca todo o seu patrimônio, inclusive seu único imóvel residencial em muitos casos, em risco para garantir a dívida de terceiros.
Para o "Meu Bolso Seguro", este artigo faz uma análise jurídica e financeira detalhada do contrato de fiança, desvendando os riscos e, o mais importante, oferecendo estratégias legais e práticas para proteger seu patrimônio e tomar decisões informadas ao considerar a fiança.
1. 📜 Análise Jurídica: O Peso da Fiança
A fiança é um contrato acessório de garantia. Ela está prevista no Código Civil (Art. 818 e seguintes) e tem uma regra fundamental: o fiador garante a dívida principal com seu próprio patrimônio.
A Cláusula Mais Perigosa: Renúncia ao Benefício de Ordem
Em termos jurídicos, o principal risco para o fiador reside na renúncia ao chamado Benefício de Ordem.
O que é Benefício de Ordem? É o direito legal do fiador de exigir que o credor (locador, banco) primeiro execute os bens do devedor principal (afiançado) antes de buscar os bens do fiador.
O Risco da Renúncia: Praticamente todos os contratos de fiança comercial (aluguéis e financiamentos) incluem uma cláusula onde o fiador renuncia expressamente a esse benefício. Isso significa que, no primeiro dia de inadimplência, o credor pode acionar judicialmente tanto o devedor principal quanto o fiador, e pode direcionar a cobrança diretamente para o patrimônio do fiador.
O Exceção da Impenhorabilidade do Bem de Família
A regra mais temida é que, no contrato de fiança locatícia (aluguel), o único imóvel residencial do fiador pode ser penhorado para quitar a dívida do aluguel.
Regra Geral: A Lei nº 8.009/90 (Lei do Bem de Família) protege o único imóvel residencial do devedor de ser penhorado.
A Exceção na Fiança: O Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou o entendimento de que esta proteção não se aplica ao fiador em contrato de locação. O raciocínio é que a fiança é uma garantia essencial para o mercado de aluguéis, e proteger o fiador nesse caso tiraria a eficácia da garantia.
Conclusão Jurídica: Ao assinar como fiador em um aluguel, você está colocando seu único imóvel residencial em risco real de perda. Em financiamentos bancários, a regra geral do Bem de Família costuma ser mantida, mas a renúncia ao Benefício de Ordem ainda coloca seu patrimônio restante sob ameaça imediata.
2. 💰 Análise Financeira: O Risco Oculto na Proporção
O risco financeiro da fiança é frequentemente subestimado porque as pessoas olham apenas para o valor mensal da dívida. O verdadeiro perigo está na proporção da dívida total e no tempo de duração do contrato.
Risco no Aluguel: Um aluguel de R$ 3.000,00 por mês, se acumular 12 meses de atraso mais multa, honorários advocatícios e custas processuais, pode facilmente se transformar em uma dívida de R$ 50.000 a R$ 70.000. Esse valor pode ser cobrado integralmente do fiador.
Risco no Financiamento: Em um financiamento imobiliário ou empresarial, o valor total garantido pode ser de centenas de milhares ou até milhões de reais. O fiador é responsável por todo o saldo devedor restante se o devedor principal falir ou desaparecer.
O Risco da Indisponibilidade
Mesmo que o fiador consiga pagar a dívida, o processo de execução judicial contra ele pode levar à indisponibilidade de seus bens. Isso significa que, enquanto o processo tramita, o fiador pode ter seus bens bloqueados, impedido de vender imóveis, veículos ou de movimentar grandes somas de dinheiro em conta. Isso paralisa a vida financeira do fiador, mesmo que ele não perca o bem no final.
3. 📝 Estratégias de Proteção e Ação Consciente
Ser fiador é um ato de confiança que exige diligência e planejamento. Se você precisa ou deseja ser fiador, deve tomar as seguintes precauções:
Antes de Assinar o Contrato:
Exija Transparência: Peça e analise detalhadamente a saúde financeira do afiançado (devedor principal). Solicite comprovação de renda, extratos e certidões negativas de débito.
Limite a Garantia (Se Possível): Em alguns contratos (embora raro em aluguéis tradicionais), tente negociar a limitação da fiança apenas a um valor específico da dívida ou a um período de tempo determinado (ex: garantir apenas os 12 primeiros meses).
Avalie o Risco do Bem de Família: Se for um contrato de locação, tenha total ciência de que seu imóvel residencial está em jogo. Se você não está disposto a perder esse bem, não assine.
Exija Contragarantia: Peça ao afiançado uma garantia a seu favor. Por exemplo, que o afiançado transfira um veículo para o seu nome (alienado fiduciariamente) até o final do contrato, ou que ele assine uma promissória de valor equivalente à dívida. Isso não elimina seu risco com o credor, mas lhe dá uma forma de reaver seu dinheiro do afiançado se tiver que pagar a dívida.
A Fiança Conjugal: Se você for casado(a) em regime de comunhão parcial ou universal, a assinatura do cônjuge é obrigatória na fiança (outorga conjugal). Certifique-se de que seu parceiro(a) está ciente e concorda com o risco. A falta da outorga pode anular a fiança.
Durante a Vigência do Contrato:
Monitoramento Ativo: Peça ao afiançado para lhe enviar comprovantes de pagamento regularmente (mensalmente). Não confie cegamente.
Ação Imediata na Inadimplência: Se você souber do primeiro atraso, notifique imediatamente o credor sobre o desejo de se exonerar (sair da fiança).
Em Aluguéis: O fiador só pode se exonerar após a prorrogação do contrato por tempo indeterminado, mediante notificação judicial ou extrajudicial ao credor. A exoneração só produz efeitos após 120 dias da notificação.
Em Financiamentos: Geralmente, a exoneração não é permitida sem a substituição por outro fiador ou outra garantia, sendo muito mais difícil de ser realizada.
Conclusão: Fiança Não é Favor, é Risco
Ser fiador é assumir o risco integral de um terceiro, um compromisso que pode ser mais arriscado do que contrair a dívida para si próprio, especialmente no caso de aluguéis, onde o único bem de família não está protegido.
Para proteger seu "Bolso Seguro" e seu patrimônio, a regra é: só seja fiador se você puder arcar financeiramente com a dívida inteira, a qualquer momento, sem comprometer seu futuro. Caso contrário, recuse ou utilize as estratégias de contragarantia e monitoramento ativo. Conhecer a lei é a sua primeira e melhor defesa.

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